Modelos de gestão, o desafio das mini-redes solares em contexto rural na Guiné Bissau

Energia na Guiné-Bissau

Por: Alfredo Pais, Gestor Setorial da Energia, TESE

Inicialmente publicado na revista Renováveis Magazine

A Guiné Bissau, é um país com uma população de aproximadamente 1.96 milhões de habitantes (Commons, 2022). Em 2010 apenas 11.5% da população total tinha acesso a serviços de eletricidade, dos quais 1,5% eram fora da rede (ALER, 2018).

Nos últimos anos, não apenas na Guiné Bissau, mas também em contextos semelhantes, a energia solar foi ganhando expressão, tanto pelas várias vantagens técnicas, como pela fácil escalabilidade e pela baixa manutenção que exige, quando comparada com outras fontes de energia renovável (não tem partes mecânicas em movimento). Outro fator a favor é a ausência de dados e estudos essenciais para produção de outros tipos de energia, como por exemplo, a eólica.

Para além da área urbana de Bissau, a rede elétrica, até ao dia de hoje, é inexistente e, tendo o país níveis de radiação bastante altos (cerca de 2000kWh/m2 (SYSTEM, 2022)), a energia solar tornou-se uma forte alternativa no meio rural, sendo implementada em pequena escala em pequenos sistemas solares caseiros, para bombagem de água a nível doméstico ou comunitário, abastecimento de antenas de rede móvel, e pontualmente em picoredes e mini-redes.

“Através de vários estudos socioeconómicos, foi já demonstrado que a população nestes meios utiliza fontes de energia mais caras e que a redução dos custos com a energia pode dinamizar as economias locais, aumentando os recursos dos agregados familiares e, consequentemente, os seus recursos para a compra de mais energia.”
Alfredo Pais, TESE

As mini-redes na Guiné-Bissau e o modelo de gestão
Ao nível dos sistemas pequenos e comunitários há uma maior facilidade de gestão; já ao nível das mini-redes, a gestão deverá ser mais ágil e profissional, de forma a enfrentar as adversidades, e tornar as mini-redes sustentáveis a longo prazo.
Na Guiné-Bissau, apesar do número reduzido de mini-redes em meio rural, é possível observar modelos de gestão que oscilam desde o comunitário, ao privado com intervenção comunitária, assim como à intervenção pública. Nestes modelos, foi e é possível recolher importante conhecimento empírico, que deve servir de base em modo de lições aprendidas aos próximos modelos a serem adotados.
O contexto da Guiné-Bissau apresenta o maior desafio nesta gestão, sendo as principais causas a grande instabilidade política, baixos níveis de escolaridade (Finanças, 2020), índices de perceção de corrupção altos (International, 2022), e os poucos recursos financeiros da população. Se, por um lado, os poucos recursos do estado não permitem o acompanhamento e seguimento da gestão das redes, este contexto também é pouco propício e apelativo para o setor privado. Prova disso é o investimento nestas centrais não envolver o setor privado nem a banca.
A melhoria destes modelos de gestão pode trazer um desenvolvimento muito acelerado, dado o potencial destas centrais como modelo de negócio, e incentivar à sua replicação, seja por doadores,
ou trazer investimento privado. Através de vários estudos socioeconómicos, foi já demonstrado que a população nestes meios utiliza fontes de energia mais caras e que a redução dos custos com a energia pode dinamizar as economias locais, aumentando os recursos dos agregados familiares e, consequentemente, os seus recursos para a compra de mais energia.

Equilíbrio
Como se pode, então, encontrar o delicado equilíbrio entre o interesse público e privado nestes modelos de gestão?
A gestão dos modelos comunitários é, normalmente, assumida por associações locais já constituídas, com experiência ou não na gestão de projetos semelhantes. Contudo, e, apesar de uma capacitação normalmente promovida pelas entidades implementadoras, estas associações normalmente não possuem experiência profissional relevante e estão longe de ter as qualificações necessárias para este tipo de gestão. Esta falta de experiência e qualificações, traduz-se na falta de agilidade, de resolução de imprevistos, e adaptação às condições de mercado, ficando o modelo de negócio originalmente desenhado estático ao longo do tempo, tornando-se, por fim, obsoleto.
Também difícil de contornar neste tipo de modelos, é a corrupção que, por consequência dos poucos recursos da população, e pouca intervenção estatal também pela mesma razão, deixa estas entidades entregues a si mesmas sem qualquer tipo de supervisão.
Mesmo considerando um modelo com recursos humanos locais, deverá haver sempre uma gestão de back office profissional, capaz de atualizar numa perspetiva de melhoria contínua o modelo, assim como haver um controlo financeiro rigoroso, de forma a garantir a sustentabilidade da central, essencialmente na reparação e substituição de componentes.
A difusão de internet no país abre novas portas ao interesse privado na gestão/supervisão profissional das mini-redes, facilitando o controlo de software de faturação, carregamentos de contadores, gestão financeira e de resolução de problemas técnicos, a um custo muito mais reduzido. Não obstante, será sempre necessária a capacitação dos recursos humanos locais.

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